Tradutor: Airton Tetelbom Stein


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PARECER

Existe atualmente uma escassez de evidências que se relaciona especificamente à mortalidade em pacientes com COVID-19 que têm alterações radiológicas da COVID-19 na admissão ao hospital e que requerem oxigenoterapia suplementar.

Identificamos evidências onde há uma taxa de mortalidade significativamente maior para aqueles que receberam oxigenoterapia, particularmente aqueles que receberam ventilação mecânica. Um estudo também relatou que a presença de opacidades de vidro moído está associada à mortalidade.

Os potenciais preditores de mortalidade em pacientes que necessitam de suporte de oxigênio foram a idade e o desenvolvimento da Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SARA).  Os fatores de risco menos consistentemente identificados foram co-morbidades (com ênfase em problemas cardíacos e malignidades), índice de massa corporal (IMC), doença respiratória anterior, necessidade de ventilação mecânica, níveis elevados de D-dímeros e um índice de oxigenação mais baixo.

ANTECEDENTES

Como o novo vírus COVID-19 é um transtorno respiratório, muitos dos que necessitam de hospitalização necessitam de terapia de oxigênio suplementar como parte de seus cuidados.  Huang et al. encontraram que o suporte de oxigênio era necessário em 32% dos pacientes [1], enquanto Chen identificou que o suporte era necessário em 76% dos casos [2].  Nos pacientes que necessitam de suporte de oxigênio, há uma série de fatores que podem influenciar a probabilidade de sobrevivência desses indivíduos, incluindo idade, sexo, comorbidades ou outras características dos pacientes. Também é importante avaliar as características clínicas das radiografias torácicas (RxT) dos pacientes que necessitam de oxigenoterapia. Estas podem incluir a presença de pneumonia (unilateral ou bilateral) ou opacidades de vidro moído [3]. A compreensão do impacto tanto das características clínicas quanto radiológicas na sobrevivência potencial de um paciente ajudará na tomada de decisões clínicas para grupos específicos de pacientes, particularmente aqueles que têm manifestações mais graves da doença. Para contribuir para esta base de conhecimento, realizamos uma rápida revisão da literatura usando um método de busca sistemática para identificar estudos relevantes para informar o gerenciamento de pacientes com base em evidências e o desenvolvimento da linha de cuidados.

EVIDÊNCIA ATUAL

Estudos incluídos

A pesquisa identificou 544 resultados (após a remoção das duplicatas), dos quais 33 estudos foram incluídos. A maioria dos estudos incluídos foram em populações chinesas em Wuhan, sendo cinco estudos de outros países: Estados Unidos, Taiwan, Espanha e Itália; um estudo incluiu pacientes de vários países (Estados Unidos, Japão, Itália, Áustria, França, Alemanha, Holanda, Espanha e Canadá). Dois dos estudos incluídos foram revisões sistemáticas. Estimativas matemáticas de mortalidade e dados dos registros nacionais onde não ficou claro se os indivíduos foram admitidos no hospital não foram incluídos neste resumo.

Estudos incluindo informações sobre oxigenoterapia

Dos 33 estudos incluídos, quatro relataram informações especificamente relacionadas a pacientes que necessitavam de oxigenoterapia [4-7]. Todos esses estudos eram séries de casos. Shen et al [4] relataram cinco pacientes gravemente enfermos, mas sem mortes, com uma idade média de 54 anos. Shen et al [5] relataram 54 pacientes gravemente enfermos com uma idade média de 68 anos. Este estudo relatou 26 mortes, porém os detalhes específicos dos pacientes não podem ser extraídos devido ao estudo original ser publicado em chinês, e a equipe de revisão não conseguiu traduzir. Bhatraju et al [7] relataram 24 casos de pacientes graves nos Estados Unidos, com idade média de 64 anos (±18 anos). Yang et al [6] relataram uma série de casos de 52 pacientes e relataram 32 mortes. A idade média dos pacientes neste estudo foi de 59,7 (±13,3) anos. Grein et al [8] compararam a mortalidade entre pacientes que receberam oxigenoterapia invasiva e não-invasiva. O estudo relatou 53 pacientes, dos quais 7 morreram; a mortalidade foi de 18% (6 de 34). Wu et al [9] relataram 201 pacientes hospitalizados, dos quais 44 (21,9%) morreram.

Yang et al [6] descreveram as características dos pacientes que necessitavam de suporte de oxigênio. Este estudo descobriu que os não sobreviventes eram mais velhos (64,6 anos [11,2] vs 51,9 anos [12,9]), (os autores realizaram testes de significância, mas não relataram os valores de p). Eles também identificaram que os não sobreviventes eram mais propensos a desenvolver a Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SARA) (26 [81%] pacientes vs 9 [45%] pacientes). Os não sobreviventes tinham maior probabilidade de receber ventilação mecânica (30 [94%] pacientes vs 7 [35%] pacientes), seja invasiva ou não invasiva. Dois outros estudos, Chen et al e Liu et al [10, 11], reforçam o risco da idade, concluindo que o uso de oxigenoterapia, ventilação mecânica e expectorante por pacientes mais velhos era significativamente maior do que o dos pacientes mais jovens. Em Wu et al [9], dos que morreram 38/44 (86,4%) receberam ventilação mecânica não invasiva, 5/44 (11,4%) receberam ventilação invasiva obrigatória e 1/44 (2,3%) receberam ventilação intermitente obrigatória com oxigenação extracorpórea por membrana. Em Grein et al [8], entre os pacientes que receberam ventilação invasiva e 5% (1 de 19) entre os que não receberam ventilação invasiva; a taxa de risco (HR) para pacientes que receberam ventilação invasiva em comparação com aqueles que receberam suporte de oxigênio não-invasivo foi de 2,78 (95% IC, 0,33 a 23,09).

Estudos relatando informações sobre oxigenoterapia ou mudanças radiológicas em suas populações

 

Outros estudos incluíram pacientes que foram admitidos no hospital, mas não compararam especificamente aqueles que precisavam de oxigenoterapia com aqueles que não precisavam. Estes estudos descreveram, entretanto, oxigenoterapia ou anormalidades de RxT/tomoagrafia computadorizada (TC) em suas populações. Vários outros estudos identificaram a idade como um fator de risco para mortalidade em populações hospitalizadas, embora detalhes específicos sejam frequentemente limitados [2, 11-18]. Por exemplo, Chen et al [10] fornecem detalhes sobre apenas dois dos nove pacientes que morreram, e não há mais informações sobre os outros pacientes. Ruan et al não encontraram nenhuma diferença entre homens e mulheres hospitalizados em uma população de 66 pacientes [14].

Ruan et al descobriram que um total de 63% (43/68) dos pacientes no grupo de mortalidade e 41% (34/82) no grupo sobrevivente tinham doenças subjacentes (p=0,0069). O estudo não especifica quais doenças subjacentes estavam especificamente associadas à mortalidade [14]. Em termos de co-morbidades, Peng et al encontraram uma associação entre o aumento do IMC e a sobrevivência. Entre os não sobreviventes, havia 88,24% (15/17) pacientes com IMC > 25 kg/m(2), que era significativamente maior do que o dos sobreviventes (18,95% (18/95), P<0,001) [19].  He et al [5] identificaram a lesão miocárdica como fator de risco para mortalidade (14 (60,9%) vs. 8 (25,8%, p=0,013). Shi et al [20] também identificaram a lesão cardíaca como fator de risco, as FCs foram calculadas em relação ao tempo desde o início dos sintomas (FC 4,26 [95% IC, 1,92- 9,49]) ou tempo desde a admissão até o ponto final do estudo (FC, 3,41 [95% IC, 1,62-7,16]). Outro fator de risco potencial identificado foi a doença respiratória. Du et al [15] encontraram uma associação com doença respiratória e mortalidade mais geral (p=0,036), e Grein et al encontraram que aqueles com asma eram mais propensos a requerer ventilação invasiva (5 invasivos em comparação a 1 não invasivo). Feng et al [16] também observaram uma associação significativa (p=0,002) entre DPOC e gravidade (como definido pela angústia respiratória, frequência respiratória ≥ 30 por minuto, saturação de oxigênio no ar ambiente em repouso ≤ 93% ou pressão parcial de oxigênio no sangue arterial / fração inspirada de oxigênio ≤ 300 mmHg).

Em termos de fatores laboratoriais e radiológicos, níveis elevados de D-dímeros também foram associados à mortalidade em quatro estudos [9, 12, 13, 21]. Por exemplo, Zhou et al relataram que dos 44/54 (81,5%) dos pacientes que morreram tinham um D-dímero de >1 μg/mL. Wu et al relataram que dos 44 pacientes que morreram tinham um nível significativamente maior de D-dímero (p=0,001) que era significativamente maior do que os sobreviventes. Peng et al também identificaram que o índice de oxigenação foi significativamente menor nos que sobreviveram em comparação aos que não sobreviveram (130 (102, 415) vs. 434 (410, 444), p<0,001) [19].

Vários estudos notaram anormalidades de RxT e TC em suas populações estudadas. Estas incluíram pneumonia unilateral [22], pneumonia bilateral [1, 7, 13, 22, 23], infiltrações bilaterais [6] e opacidades de vidro moído [13, 20-24]. Um estudo (Cao et al [18]) encontraram uma taxa de mortalidade de 17/102 pacientes. Eles concluíram que a opacidade do vidro moído estava associada à mortalidade, presente em 41,2% dos casos em que o paciente morreu contra 12,9% daqueles que viviam.

Revisões Sistemáticas

Foram identificadas duas revisões sistemáticas, ambas relatando taxas de fatalidade de casos, mas não especificamente em populações que requerem oxigenoterapia. Rodriguez-Morales et al. realizaram uma revisão de 7 estudos descrevendo 632 pacientes hospitalizados [25]. O estudo relatou uma taxa de fatalidade de 13% e que 32,8% apresentavam SARA. Fu et al [26] realizaram uma revisão sistemática e uma meta-análise de 43 estudos que incluíram dados derivados de 3.600 pacientes hospitalizados. Este estudo relatou a prevalência de opacidades de vidro moído (80,0%), pneumonia bilateral (73,2%) e oxigenoterapia (71,5%); a taxa de mortalidade geral nesta revisão foi de 3,6%, mas nenhuma informação de mortalidade foi relatada nas populações com opacidades de vidro moído e pneumonia bilateral.

CONCLUSÕES

Existe atualmente uma escassez de evidências boas ou robustas relacionadas a associações com a mortalidade e preditores em pacientes com COVID-19 que requerem oxigenoterapia e que têm alterações radiológicas da COVID-19 na admissão ao hospital. A maioria dos estudos são séries de casos retrospectivos com populações relativamente pequenas. Nas evidências identificadas, há uma taxa de mortalidade significativamente maior para aqueles que receberam oxigenoterapia, particularmente aqueles que receberam ventilação mecânica. Um estudo também relatou que a presença de opacidades de vidro moído está associada à mortalidade.

Os fatores de risco potenciais de mortalidade identificados em uma população que requer suporte de oxigênio são a idade e o desenvolvimento das Doença Aguda Respiratória. Outros estudos também identificaram a idade avançada como um fator de risco para a mortalidade, embora estas fossem em geral populações hospitalizadas e não aquelas que necessitavam especificamente de oxigenoterapia. Outros fatores que foram supostamente de potencial impacto na mortalidade foram a comorbidade (dois estudos com doenças especificamente cardíacas e um com comorbidades de forma mais geral). Outro estudo sugeriu que um IMC mais elevado poderia ter um impacto sobre a mortalidade. Outros fatores de risco potenciais eram doenças malignas e doenças respiratórias anteriores.

Fatores clínicos associados ao aumento da mortalidade em uma população que necessitava de suporte de oxigênio foram o recebimento de ventilação mecânica. Níveis elevados de D-dímeros e um menor índice de oxigenação também foram associados com maior mortalidade em populações hospitalizadas em geral.

Declaração de responsabilidade: Este artigo não foi revisto por pares; não deve substituir o julgamento clínico individual e as fontes citadas devem ser verificadas. As opiniões expressas neste comentário representam as opiniões dos autores e não necessariamente as da instituição anfitriã, do NHS, do NIHR, ou do Departamento de Saúde e Assistência Social. Os pontos de vista não são um substitutos para conselhos médicos profissionais.

TERMOS DE BUSCA

A estratégia de busca que foi aplicada à MEDLINE e EMBASE está abaixo. A busca foi realizada em 20/04/2020.

(COVID-19 OR “2019 novel coronavirus infection” OR COVID19 OR COVID-19 OR “coronavirus disease 2019” OR “coronavirus disease-19” OR “2019-nCoV disease” OR “2019-nCoV infection” OR “severe acute respiratory syndrome coronavirus 2” OR “Wuhan coronavirus” OR “COVID-19 virus” OR “SARS-CoV-2” OR “SARS2” OR “2019-nCoV” OR “2019 novel coronavirus”) AND (Mortality OR Mortalit* OR “Case Fatality Rate” OR “Excess Mortality” OR “Mortality Decline” OR “Mortality Determinant” OR “Differential Mortalities” OR “Age-Specific Death Rate” OR “Death Rate” OR “Mortality Rate”).

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REFERENCES

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