Tradutor: Ana Paula Pires dos Santos, Luis Eduardo Fontes
Entender a mortalidade requer entender a variação ao longo do tempo, entender como o número de mortes difere do valor médio do que você esperaria, e não tirar conclusões precipitadas
Jason Oke, Carl Heneghan.
3 de abril de 2020
Em nome do time Oxford COVID-19 Evidence
Centro de Medicina Baseada em Evidência, Nuffield Department of Primary Care Health Sciences
Universidade de Oxford
Correspondência para: cebm@phc.ox.ac.uk
A estimativa dos dados de mortalidade é repleta de problemas. Atualmente, há uma diferença de 30 vezes entre a maior e a menor taxa de mortalidade entre os países.
Como podemos saber se a COVID-19 é a principal causa dessas mortes? Ou se essas mortes teriam ocorrido na ausência da COVID-19, particularmente em idosos e pessoas com problemas crônicos de saúde? (veja o artigo de David Spiegelhalter para uma explicação).
Uma maneira é examinar as taxas de mortalidade e determinar se há mais pessoas morrendo do que se esperaria.
O que queremos saber é se as mortes relatadas pela COVID representam um “excesso” em relação à norma.
Para responder a essa questão, obtivemos contagens provisórias do número de mortes registradas na Inglaterra e no País de Gales, por idade, sexo e região, desde 2016 até as últimas semanas para as quais há dados disponíveis. A Figura mostra o número semanal de mortes registradas para todas as idades.
Na semana que terminou em 3 de abril de 2020 ocorreram 16.387 mortes: a média de mortes nos últimos cinco anos é representada pela linha vermelha.
Depois traçamos o total semanal de mortes menos a média esperada de mortes nos cinco anos anteriores.
Figura 2 Diferença entre o total de mortes e as mortes esperadas ao longo de uma média de 5 anos.
O total de mortes na semana 14 foi de 16.387 em comparação com a média de 5 anos de 10.305. Isto representa um excesso de 6.082 mortes e 59% a mais do que o esperado, RR 1,59 (IC 95% 1,55 a 1,63; p<0,0001).
O número de mortes excedeu 3 DPs (desvios-padrão) em cinco ocasiões distintas nos últimos três anos. No período entre o inverno de 2017 e o de 2018, houve 50.100 mortes em excesso na Inglaterra e no País de Gales (as doenças respiratórias causaram mais de um terço (35%) de todas as mortes em excesso). O maior número de mortes já registrado (do qual temos conhecimento) por semana ocorreu na semana 52 de 1999, quando foram registradas 18.500 mortes.
O excesso no número de mortes foi devido à COVID?
Das 6.082 mortes em excesso, 3.475 (57%) mencionaram COVID no atestado de óbito (43% das mortes em excesso não mencionaram COVID).
Há três explicações possíveis para o por quê da COVID não ser mencionada no atestado de óbito
- Subnotificação da COVID em certidões de óbito
- As mortes de outras causas estão aumentando
- As mortes são relatadas de forma mais eficiente e reveladas a partir das semanas seguintes
Para melhor explorar os dados, nós comparamos o excesso de mortes com aquele da semana anterior: houve 11.141 mortes, um excesso de 5.246 mortes na semana 14 em comparação com a semana 13.
A figura mostra que, em cerca de um terço dessas mortes em excesso, a COVID não é mencionada no atestado de óbito (dados no final do artigo).
Naqueles com mais de 85 anos. A COVID não é mencionada em 41% das mortes registradas, sugerindo algum elemento de subnotificação. A falta da COVID no atestado de óbito é notável a partir dos 45 anos de idade, sugerindo que as mortes por outras causas estão aumentando e/ou alguma notificação está começando a aparecer.
O relatório do ONS (“Office for National Statistics” – Gabinete de Estatísticas Nacionais) não nos diz se a COVID foi mencionada como a doença ou condição que levou diretamente à morte.
- A causa imediata da morte – (primeira linha do atestado de óbito na Parte I)
- As causas subjacentes da morte – consideram a cadeia de eventos que levam à morte (linhas mais inferiores na Parte I)
Todas as mortes por doenças respiratórias (CID-10 J00-J99) incluem mortes por pneumonia viral (codificada como J12). As mortes por doenças respiratórias subiram para 2.106 na semana 14, um aumento de 572 (27%) mortes em uma semana.
As mortes na semana 14 aumentaram significativamente e estão de acordo com a divulgação diária de dados do governo do Reino Unido. As mortes respiratórias são em menor número do que as das primeiras semanas do ano e as mortes por COVID-19 são em menor número do que os modelos pandêmicos estavam predizendo.
Dados comparando o excesso de mortes por idade na semana 14 com a semana anterior.
Idade | Excesso de mortes por idade na semana passada (n) | Menção da COVID no atestado de óbito (n) | Diferença percentual |
Menor de 1 ano | 2 | 0 | 0,0% |
01-14 | 8 | 0 | 0,0% |
15-44 | 6 | 43 | 716,7% |
45-64 | 559 | 412 | 73,7% |
65-74 | 929 | 626 | 67,4% |
75-84 | 1.758 | 1.231 | 70,0% |
85+ | 1.984 | 1.163 | 58,6% |
Total | 5.246 | 3.475 | 66,2% |
veja também Avaliação da mortalidade no surto da COVID-19
AUTORES
Jason Oke é um estatístico senior no Nuffield Department of Primary Care Health Sciences. (Biografia aqui)
Carl Heneghan é professor de Medicina Baseada em Evidência, Diretor do Centro de Medicina Baseada em Evidência. (Biografia completa e declaração de transparência aqui)
Aviso: o artigo não foi revisado por pares; ele não deve substituir o julgamento clínico individual e as fontes citadas devem ser verificadas. As opiniões expressas neste comentário representam as opiniões dos autores e não necessariamente as da instituição anfitriã, do NHS, do NIHR, ou do Departamento de Saúde e Assistência Social. Os pontos de vista não são um substituto para o aconselhamento médico profissional.