Tradutores: Carine Raquel Blatt, Maria Regina Torloni


Parecer

As evidências são muito limitadas e atualmente não há uma resposta definitiva para esta pergunta. Esta questão será revisada à medida que novas evidências relevantes forem identificadas, e o relatório será modificado de acordo com os novos achados. No entanto, no Reino Unido, o NHS recomenda que, no momento, os médicos de família ou clínicos gerais não devem fornecer prescrições com maior duração, a fim de proteger a cadeia de fornecimento de medicamentos.

Contexto

Os pacientes com condições crônicas controladas, como diabetes, hipertensão ou asma, frequentemente recebem prescrições “repetidas”. No Reino Unido, essas receitas são geralmente fornecidas sem que o paciente passe em nova consulta com um médico de família ou clínico geral.

Durante uma epidemia, os pacientes podem ter dificuldades para se deslocar e obter uma receita médica. A atual pandemia da COVID-19 afeta um grande número de pessoas, e especialmente a população idosa que foi aconselhada a permanecer em casa por até 12 semanas. Além disso, toda a população está sujeita a algum tipo de restrição de deslocamento. A prescrição repetida ocupa o tempo do paciente, do médico de família ou clínico geral, e dos farmacêuticos. Na Inglaterra, para medicamentos comumente prescritos para doenças crônicas, 45% do volume total em 2019 foi prescrito para um mês de tratamento, 41% para dois meses e 7% para três meses. (EBM Datalab 2020)

Durante a atual pandemia da COVID-19, há vários possíveis benefícios em fornecer prescrições que cobrem 3 meses de tratamento, ao invés de períodos mais curtos, tais como:

– reduzir o contato de pessoa a pessoa e assim diminuir as taxas de transmissão

– reduzir a ansiedade dos pacientes com doenças crônicas que precisam de prescrições repetidas

– reduzir a demanda e os custos dos serviços de saúde.

Por outro lado, durante uma pandemia global é possível que as interrupções na fabricação e em outras atividades possam agravar a escassez de medicamentos que ocorreram no Reino Unido nos últimos anos (BBC News 2019). Outros aspectos que devem ser levados em consideração são o possível desperdício de medicamentos e o risco de manter estoques de medicamentos em casa, além do fato de que alguns pacientes podem não ter condições de arcar com os custos de uma prescrição que cubra um período de tratamento mais longo.

Esta revisão rápida teve como objetivo avaliar as evidências sobre os efeitos de fornecer prescrições repetidas com maior duração durante uma pandemia.

EVIDÊNCIA ATUAL

Fizemos uma busca rápida em bancos de dados eletrônicos e repositórios online de literatura cinza em busca de evidências sobre esta questão e encontramos uma revisão sistemática (King 2018). Essa revisão incluiu 13 estudos que compararam o fornecimento de prescrições para 2-4 meses de tratamento versus prescrições para 28-30 dias. Essa mesma revisão sistemática também foi publicada como um relatório de Avaliação de Tecnologia em Saúde (Miani 2017).

Os estudos incluídos foram todos realizados em um único país (EUA) e sua qualidade variou de moderada a muito baixa. Os autores não encontraram estudos que tivessem avaliado os efeitos de prescrições repetidas em intervalos maiores versus menores sobre desfechos de saúde ou eventos adversos. A revisão encontrou evidência, proveniente de estudos de moderada qualidade, que prescrições com maior duração estão associadas a maior adesão dos pacientes aos medicamentos. Existe também alguma evidência, proveniente de estudos de qualidade muito baixa, que as prescrições com maior duração aumentam o desperdício de medicamentos.

Encontramos também um estudo de coorte retrospectivo por Doble et al. 2018, conduzido em serviços do NHS. Os autores relataram que as prescrições repetidas em intervalos menores podem reduzir o desperdício de medicamentos, mas também podem aumentar as taxas de dispensação e/ou o tempo necessário para emitir as prescrições.

EVIDÊNCIAS EMERGENTES NA COVID-19

A base de evidências para tirar conclusões é muito limitada. Nenhum estudo foi realizado durante um período pandêmico ou avaliou o impacto de mudanças na duração de prescrições repetidas sobre a cadeia de suprimento dos medicamentos.

No entanto, existem orientações do NHS (Reino Unido) emitidas em 19 de março de 2020:

“O Departamento de Saúde e Assistência Social está trabalhando em estreita colaboração com a indústria, o NHS e outros na cadeia de suprimentos para garantir que os pacientes possam ter acesso aos medicamentos de que necessitam e estamos tentando reduzir a probabilidade de desabastecimentos futuros.

É essencial que os médicos de família ou clínicos gerais não emitam receitas médicas por um período mais longo, que as farmácias não encomendem quantidades maiores, e que os pacientes e o público não procuram estocar medicamentos, pois esse comportamento pode colocar em risco a cadeia de suprimentos”.

Durante uma pandemia, é necessária uma abordagem pragmática que incorpore o julgamento clínico, levando em consideração tanto as necessidades individuais dos pacientes quanto a capacidade da cadeia de suprimento dos medicamentos. Na Inglaterra, o NHS aconselha o uso da prescrição eletrônica repetida onde um médico autoriza uma prescrição por até doze meses, permitindo ao paciente usar as prescrições repetidas diretamente em uma farmácia sem a necessidade de uma nova consulta. É importante ressaltar que como isto não aumenta a duração entre o período de uso de cada prescrição para o paciente, haverá mudanças limitadas nos volumes esperados na cadeia de suprimento dos medicamentos. Esta abordagem é adequada para pacientes com doenças crônicas controladas, e possibilita uma consulta mensal com um farmacêutico que pode facilitar o acesso do paciente a uma consulta médica se houver mudanças na sua condição clínica. Esta abordagem pode ajudar o paciente a ficar em casa durante períodos de distanciamento social ou quarentena, além de reduzir a ansiedade das pessoas que precisam de prescrições repetidas e pode ainda ajudar a reduzir a carga sobre os serviços de saúde, mantendo o fornecimento adequado de medicamentos.

CONCLUSÕES

A base de evidência é muito limitada e não há uma resposta definitiva para essa questão

Para otimizar a prática, é necessário mais evidências sobre os efeitos da duração de prescrições repetidas, especialmente sobre desfechos de saúde.

A orientação local pode guiar a prática. Por exemplo, no Reino Unido, o NHS tem atualmente aconselhado contra prescrições mais longas.

Fim.

Isenção de responsabilidade: o artigo não foi revisado por pares; não deve substituir o julgamento clínico individual, e as fontes citadas devem ser verificadas. As opiniões expressas neste comentário representam as opiniões dos autores e não necessariamente as da instituição anfitriã, do SNS, do NIHR, ou do Departamento de Saúde e Assistência Social. Essas opiniões não substituem o aconselhamento profissional de um médico.

AUTORES

Kamal Mahtani, Brian MacKenna, Elizabeth Spencer

PALAVRAS USADAS NAS BUSCAS

duração da prescrição repetida

pandemia

 


REFERÊNCIAS

  1. https://www.bbc.co.uk/news/health-46843631 Accessed 20 March 2020
  2. Doble B, Payne R, Harshfield A, Wilson ECF. Retrospective, multicohort analysis of the Clinical Practice Research Datalink (CPRD) to determine differences in the cost of medication wastage, dispensing fees and prescriber time of issuing either short (<60 days) or long (≥60 days) prescription lengths in primary care for common, chronic conditions in the UK. BMJ Open. 2017 Dec 4;7(12):e019382. doi: 10.1136/bmjopen-2017-019382.
  3. EBM Datalab 2020 https://github.com/ebmdatalab/repeat-prescribing-pandemic-covid-notebook/blob/master/notebooks/pandemic-repeat-prescriptions.ipynb Accessed 21 March 2020
  4. King S, Miani C, Exley J, Larkin J, Kirtley A, Payne RA. Impact of issuing longer- versus shorter-duration prescriptions: a systematic review. Br J Gen Pract. 2018 Apr;68(669):e286-e292. doi: 10.3399/bjgp18X695501.
  5. Miani C, Martin A, Exley J, Doble B, Wilson E, Payne R, Avery A, Meads C, Kirtley A, Jones MM, King S. Clinical effectiveness and cost-effectiveness of issuing longer versus shorter duration (3-month vs. 28-day) prescriptions in patients with chronic conditions: systematic review and economic modelling. Health Technol Assess. 2017 Dec;21(78):1-128. doi: 10.3310/hta21780.
  6. Second Chief Pharmaceutical Officer Community Pharmacy COVID-19 Letter. NHS England. https://www.england.nhs.uk/coronavirus/wp-content/uploads/sites/52/2020/03/preparedness-letter_primary-care_community-pharmacy-19-march-2020.pdf
  7. Electronic Repeat Dispensing Handbook. Wessex Academic Health Science Network. https://wessexahsn.org.uk/img/projects/Electronic%20Dispensing%20Handbook_Digital_WEB_S.pdf