Tradutores: Michele Palmeira S Reisky von Dubnitz, Ana Luiza Cabrera Martimbianco


 

 

A pontuação Roth deve ser utilizada na avaliação remota de dispneia?

A pontuação Roth não deve ser utilizada na avaliação remota de dispneia no contexto do COVID-19, por 3 razões:

  • Pode ser normal em paciente com hipoxemia severa
  • Pode ser alterado em paciente sem hipoxemia
  • Poderia ofuscar uma visão mais holística do paciente.

Professor Trisha Greenhalgh

Em nome da equipe de serviço de evidência Oxford COVID-19

Nuffield Department of Primary Care Health Sciences

Universidade de Oxford

Correspondência para trish.greenhalgh@phc.o.ac.uk

PARECER

Não use a pontuação Roth para avaliar dispneia por telefone.

  • Não existem testes validados para avaliar dispneia por telefone em um atendimento primário agudo
  • Medir a frequência respiratória de um paciente por telefone usando a pontuação Roth não fornece uma avaliação precisa da hipoxemia e pode levar a falsa garantia
  • Especialistas recomendam uma avaliação clínica geral, incluindo perguntas sobre a natureza da dispneia e suas alterações.

CONTEXTO

 

A crise do COVID está exigindo que administremos pacientes com o mínimo de contato possível. A avaliação remota de um paciente com problemas respiratórios é problemática, e os médicos buscam incansavelmente ferramentas que tornem essa avaliação a mais objetiva e direta possível. Isso é particularmente importante em pacientes com COVID-19, uma vez que a hipóxia é um sinal de alerta sério para pneumonia grave,1 e a maioria dos pacientes não possui oxímetros precisos em casa. Uma revisão rápida de nossa equipe sobre a avaliação da dispneia em consultas remotas2  constatou que a maioria dos escores havia sido desenvolvida para o monitoramento a longo prazo de doenças respiratórias crônicas em ambiente ambulatorial e inadequada para o ambiente agudo. Também apareceu um único estudo descrevendo um teste (a pontuação Roth) para avaliação da dispneia aguda.3

Declaramos originalmente que não recomendamos o uso da pontuação Roth (porque não foi validado em unidades básicas de saúde de atendimento agudo e porque os especialistas achavam que isso poderia causar danos), mas mereceria uma avaliação mais aprofundada. Também afirmamos que a avaliação do paciente com dispneia deve incluir uma história cuidadosa com uma série de perguntas (reproduzidas abaixo) e, de preferência, uma avaliação com vídeo.

Apesar dessa recomendação muito cautelosa, a pontuação de Roth foi rapidamente reproduzida e divulgada nas mídias sociais, nas listas de contato profissional e nas diretrizes locais e nacionais. As precauções associadas ao nosso conselho original não foram divulgadas. Pelo contrário, a pontuação Roth foi amplamente e rapidamente recomendado como um teste “objetivo” para hipóxia. Parece ter sido usado por alguns clínicos como substituto de uma história completa e de uma avaliação remota por vídeo. Recebemos relatos de eventos significativos nos quais pacientes em deterioração foram tranquilizados por causa de uma pontuação Roth “normal”.

Neste artigo, reiteramos nossa análise do artigo de Chorin, destacando problemas com validade interna (podemos confiar no estudo?) E validade externa (se aplica à situação clínica atual?).

O QUE É A PONTUAÇÃO ROTH?

 

A pontuação Roth é uma ferramenta para quantificar o nível de dispneia, que se supõe correlacionar com o nível de hipóxia. Ele combina a contagem máxima atingida (começando de 1 a 30, no idioma nativo) durante uma única expiração e o tempo necessário para atingir a contagem máxima (a segunda pontuação é chamada de “tempo de contagem”).

A pontuação  Roth, nomeada em homenagem ao cardiologista que o desenvolveu, foi objeto de um único estudo de validação contra a oximetria de pulso em um pequeno estudo realizado em Israel, em uma unidade coronariana.3 O grupo de pacientes era composto por 93 pessoas (53 homens, 40 mulheres), com idade média de 76 ± 13 anos. Os diagnósticos de admissão foram exacerbação de insuficiência cardíaca congestiva (25%), pneumonia (17%) e síndrome coronariana aguda (15%). O grupo controle constituiu de 103 voluntários saudáveis ​​(64 homens, 39 mulheres) com idade média de 56 ± 18 anos.

O estudo mostrou uma forte correlação positiva entre a medida da oximetria de pulso em ar ambiente e a contagem máxima alcançada em 1 respiração (r = 0,67; P <0,001) e o tempo de contagem (r = 0,59; P <0,001). Todos os indivíduos do grupo controle contaram até pelo menos 15 em 1 respiração e 97 (94%) contaram até pelo menos 20. As pontuações plotadas na curva de características operacionais do receptor (ROC) e a AUC foram calculadas. O tempo de contagem < 8 segundos apresentou sensibilidade de 78% e especificidade de 71% para identificação de oximetria de pulso em ar ambiente <95%.

Embora esses achados confirmem que a pontuação Roth está correlacionada com o nível de hipóxia, eles não mostram que o teste é válido ou seguro. Nós analisamos criticamente o artigo abaixo.

AVALIAÇÃO CRÍTICA DO ESTUDO DA PONTUAÇÃO ROUTH POR CHORIN ET AL33

 

Houve uma comparação mascarada e independente com um padrão de referência (ouro) de diagnóstico?

O teste de Roth foi comparado com a oximetria de pulso. Esse não é o padrão ouro (a gasometria arterial avalia melhor), mas a oximetria de pulso tem boa correlação com a GSA.

O teste de diagnóstico foi avaliado em um espectro apropriado de pacientes (como aqueles que um médico avaliaria na prática)?

Não em relação ao uso no caso que estamos considerando (avaliação de pacientes com COVID-19 por telefone). Primeiro, ninguém na amostra tinha COVID-19. Segundo, ninguém com SatO2 abaixo de 92% foi incluído. Terceiro, os pacientes da amostra já haviam sido admitidos no hospital (ou seja, a decisão diagnóstica de admitir já havia sido tomada). Quarto, a maioria era cardíaca, não respiratória. Quinto, eles foram avaliados à beira do leito, não por telefone. Esta amostra de validação se compara mal aos pacientes com COVID-19 (que podem ser profundamente hipoxêmicos) avaliados em um ambiente de cuidados primários.

O teste foi validado em um segundo grupo independente de pacientes?

Foi validado em voluntários saudáveis.

Qual a acurácia do teste?

Mesmo nas condições em que foi validado, a pontuação Roth (medida em termos de tempo de contagem < 8 segundos – o chamado “teste de 8 segundos”) classificará erroneamente um paciente hipoxêmico em cinco como normal. Além disso, a pontuação Roth é frequentemente anormal em pacientes que não são hipoxêmicos. No contexto de uma pandemia de COVID, isso levaria esses pacientes a serem enviados a um local de atendimento ou a um hospital desnecessariamente, expondo-os ao risco de contágio.

 

CONCLUSÕES

 

  • Mesmo nas condições em que foi testado, o teste de Roth não tem acurácia suficiente para classificar as pessoas como hipoxêmicas ou não, com base em um teste de contagem de 8 segundos
  • O teste de Roth foi validado em condições muito diferentes daquelas em que seria usado nas avaliações do COVID-19
  • Portanto, não recomendamos.

QUE TESTE DEVE SER USADO AO INVÉS DA PONTUAÇÃO ROTH?

Na pendência de mais pesquisas, as recomendações abaixo são baseadas na opinião de especialistas. Uma pesquisa rápida com 50 médicos que avaliam regularmente pacientes por telefone (em 20.3.20) recomendou não usar a pontuação Roth (embora as opiniões fossem variadas) e apresentou os seguintes conselhos:

  1. Peça ao paciente que descreva a dificuldade na respiração com suas próprias palavras e avalie a facilidade e o conforto de sua fala. Faça perguntas abertas e ouça se o paciente pode concluir suas frases.

“Como está a sua respiração hoje?”

 

  1. Associe com o check list de sintomas NHS111, que faz três perguntas (desenvolvidas através do teste do usuário, mas não avaliadas na pesquisa formal):

“Você está tão ofegante que não consegue falar mais do que algumas palavras?”
“Você está respirando mais forte ou mais rápido que o normal quando não está fazendo nada?”

“Você está tão doente que parou de fazer todas as suas atividades diárias habituais? ”

  1. Concentre-se na mudança. Uma história clara de deterioração é mais importante do que se o paciente atualmente sente dispneia. Faça perguntas como:

“Sua respiração está mais rápida, mais lenta ou igual à normal?”

“O que você conseguia fazer ontem e não consegue fazer hoje?”

“O que o deixa sem fôlego agora que não o deixou sem fôlego ontem?”

  1. Interprete a dispneia no contexto da história mais ampla e dos sinais físicos. Por exemplo, um novo chiado audível e um relato verbal de cianose nos lábios em um paciente dispneico são preocupantes.

Além disso, conforme recomendado na “Consulta de dez minutos” do BMJ sobre a avaliação remota de um paciente com possível COVID-19, recomendamos que um exame por vídeo adicione detalhes importantes, como se o paciente está cianótico, a extensão do esforço respiratório e a oportunidade de contar a frequência respiratória.1

 

Declaração de transparência: o artigo não foi revisado por pares; não deve substituir o julgamento clínico individual e as fontes citadas devem ser verificadas. As opiniões expressas neste comentário representam as opiniões dos autores e não necessariamente as da instituição anfitriã, do NHS, do NIHR ou do Departamento de Saúde e Assistência Social. As opiniões não substituem aconselhamento médico profissional.

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Link para o original: https://www.cebm.net/covid-19/roth-score-not-recommended-to-assess-breathlessness-over-the-phone/

Nome dos autores e afiliações: Trisha Greenhalgh

Em nome da equipe do Serviço de Evidência Oxford COVID-19

Nuffield Department of Primary Care Health Sciences
University of Oxford

Deve ser citado como: Trisha Greenhalgh  https://www.cebm.net/covid-19/roth-score-not-recommended-to-assess-breathlessness-over-the-phone/

Fontes:

  1. Greenhalgh T, Koh GCH, Car J. Covid-19: a remote assessment in primary care. Bmj2020;368:m1182. doi: 10.1136/bmj.m1182 [published Online First: 2020/03/28]
  2. Greenhalgh T, Kotze K, Van Der Westhuizen H-M. Are there any evidence-based ways of assessing dyspnoea (breathlessness) by telephone or video?: Oxford COVID-19 Evidence Service Rapid Review. 30th March 2020. Accessed 1.4.20 at https://www.cebm.net/covid-19/are-there-any-evidence-based-ways-of-assessing-dyspnoea-breathlessness-by-telephone-or-video/.
  3. Chorin E, Padegimas A, Havakuk O, et al. Assessment of Respiratory Distress by the Roth Score. Clinical cardiology2016;39(11):636-39.