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Recentemente o Brasil foi surpreendido com acusações de plagiarismo acadêmico envolvendo o indicado para o cargo de Ministro da Educação. Não foi o primeiro caso na esfera política e governamental, tampouco é um fenômeno raro em outras áreas de propriedade intelectual.

Existem muitas definições de plágio e plagiarismo na literatura, mas existe um consenso de que se trata de usar ou apresentar o trabalho ou ideia de outros como sendo de sua autoria, sem permissão dos autores originais, sem referenciá-los.

Na verdade, é legítimo e essencial que outros trabalhos sejam citados em uma produção intelectual, seja para contextualização do tema, para expor o que já se conhece sobre ele e para fomentar discussão e pensamento crítico gerado a partir do novo trabalho. Entretanto, é frequente o uso inapropriado e não referenciado de propriedade intelectual de outrem. Neste blog vou abordar o aspecto acadêmico do plágio.

Sendo intencional ou não, o plágio é considerado má prática acadêmica, conduta antiética, demonstração de falta de empenho na escrita, e é crime previsto na lei brasileira e em outros países. No meio universitário, é passível de punições que variam de redução de notas até a expulsão do aluno, além de denegrir a imagem da instituição de ensino e do próprio plagiador. Apesar disso, a integridade científica não recebe adequada atenção na maioria das escolas médicas no Brasil e no mundo. Dados de pesquisas conduzidas pelo International Center for Academic Integrity com graduandos e pós-graduandos mostram que muitos admitem ter cometido algum tipo de plágio em testes, trabalhos, ou em ambos. Isto certamente vai, mais tarde, se refletir na produção científica de pessoas mal orientadas, malformadas e, em certos casos, mal-intencionadas. Um estudo que avaliou 495 artigos mostrou que 313 (63%) deles submetidos a 100 revistas médicas continham evidência de plágio, e apenas 26% das revistas possuíam políticas claras contra este problema.

Vítimas de plágio

Qualquer material de propriedade intelectual pode ser alvo de plagiarismo – textos, ideias, músicas, figuras, desenhos etc. O meio musical é frequentemente acometido por casos de plágio, por vezes de grande repercussão, que acabam se arrastando em longas batalhas jurídicas. Um exemplo é o caso do rapper Vanila Ice contra David Bowie e a banda inglesa Queen, nos anos 90, pelo suposto plágio de “Under Pressure” na música “Ice Ice Baby”. No meio acadêmico, infelizmente, o plagiarismo também é uma prática comum e antiga.

Tipos de plágio

Existem diversos tipos de plágio acadêmico, e nem sempre os profissionais os conhecem a fundo, o que faz necessária uma breve revisão:

  • Plagiarismo direto (palavra por palavra) – citação literal, uso de frases com as mesmas palavras e linguagem de outro autor, sem citar a fonte.

  • Parafraseamento – tipo comum de prática, onde o infrator usa um texto de outro autor mudando apenas algumas poucas palavras ou as invertendo na frase, mas seguindo uma estrutura idêntica de argumento, na tentativa de disfarçar a cópia, e sem citar a origem.

  • Conluio – muito comum, situação na qual geralmente estudantes exercem colaboração não autorizada, prática comum em trabalhos de grupo em que uma pessoa que não produziu uma parte, se apropria como se fora autoria dela.

  • Plagiarismo referente à fonte – pode ocorrer quando um autor usa uma fonte secundária para obter uma informação e cita a fonte primária, não citando a secundária. Citações não acuradas fazem parte deste tipo de plágio. Falsificação e fabricação de dados ou fontes também se enquadram neste tipo grave de delito ético em pesquisa.

  • Copiar e colar textos da internet – prática infelizmente pandêmica (aproveitando o momento) em cursos de graduação e pós-graduação, em que o infrator ainda comete o erro de não dar crédito ao autor original ou fonte.

  • Ausência de agradecimento – ocorre quando um autor recebe ajuda em parte do trabalho e não reconhece ou agradece publicamente, como na assistência de um especialista em informação para realizar uma estratégia de busca durante uma revisão sistemática, deixando a entender que o trabalho foi todo do autor.

  • Autoplagiarismo – consiste em reutilizar parte de trabalho próprio e aproveitá-lo em outra produção, ou apresentar trabalho idêntico a duas instituições diferentes. No caso de trabalho publicado, é tema de debate se algumas partes podem ser usadas, desde que com citação.

Alguns temas relacionados com autoria são tratados como plágio, mas acredito que autoria (e suas deturpações) são um problema específico e não tratarei deste ponto neste post.

Como evitar o plagiarismo

A melhor maneira de evitar o plagiarismo é a educação precoce em princípios de boas práticas acadêmicas, se possível já no ensino fundamental e médio, reforçados durante o ensino superior. Aprender a corretamente dar crédito a passagens de autoria de outras pessoas, inserir citações em textos, desenvolver suas próprias ideias a partir de trabalhos de outros, são habilidades que se aperfeiçoam com a prática. Outrossim, o aluno precisa aprender que, além de crime, o plagiarismo tolhe suas oportunidades de aprendizado e de evolução, motivo pelo qual ele está cursando a instituição de ensino. É importante que o aluno seja orientado e consiga perceber que, ao evitar o plagiarismo, sua evolução de aprendizado se consolida e sua produção ganha credibilidade, qualidade, autoridade, a sua identidade.

Outra perspectiva que pode ser útil é mostrar ao aluno que ele pode ser vítima de plágio, e como ele pode agir para defender sua propriedade intelectual. Exemplos históricos de plágio também podem envolver o aluno a pensar no assunto, com demonstrações de como como o infrator poderia ter evitado o erro.

Os professores precisam ser envolvidos e assumirem sua responsabilidade no processo. É necessário que o próprio professor seja orientado, para que ele possa orientar seus alunos. E suas atitudes servem como exemplos. Muitas vezes é fácil aplicar trabalhos que nunca são checados contra plagiarismo. Ao perceber que a prática não é coibida na instituição de ensino, o aluno não assimila o erro e não é municiado com orientações para não mais cometê-lo. Além da educação, políticas mais claras e restritivas de detecção e punição de plagiarismo em meios de publicação são fundamentais para que o ambiente de honestidade e integridade acadêmica floresça e se consolide. Revistas médicas, representadas por seus corpos editoriais, têm um papel fundamental para que o cenário seja melhor no futuro.

O uso de ferramentas para detecção de plágio é uma estratégia interessante e muito útil para evitar problemas, muitas vezes não intencionais. Muitas ferramentas disponíveis no mercado são pagas, mas existem algumas gratuitas que podem ajudar a detecção de textos copiados e citações não incluídas, como por exemplo o Grammarly, QueText, Plagium e Plagiarism Detector. O próprio Google pode ajudar a detectar trechos plagiados ao se colar o texto de interesse em sua caixa de busca.

Sir Isaac Newton um dia escreveu ao seu rival Robert Hooke: “O que Descartes fez foi um grande passo. Você acrescentou muito, de diversas maneiras. Se eu enxerguei mais longe, foi porque me apoiei em ombros de gigantes”. Isaac Newton jamais plagiou o trabalho de seus colegas ao dizer que se apoiara em gigantes. Ao contrário, deu a eles crédito pelas descobertas que antecederam as suas geniais teorias e invenções nos campos da matemática, física, astronomia, óptica, teologia, alquimia e filosofia. E reza a lenda que Robert Hooke tinha baixa estatura.

 

Luis Eduardo Fontes é médico, cofundador da Oxford-Brazil EBM Alliance e professor da Faculdade de Medicina de Petrópolis.

Revisão jornalística: Patricia Logullo

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