Tradutores: Tatiane Ribeiro, Ana Luiza Cabrera Martimbianco, Rachel Riera


Veredito: É preciso precaução na utilização de anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) no contexto de infecções respiratórias agudas (IRAs). Condições de saúde preexistentes e medicamentos em uso são informações que precisam ser consideradas ao se decidir sobre a prescrição de AINEs para IRA sintomática. A menor dose efetiva deve ser prescrita e pelo menor período possível. O uso de AINEs por via parenteral deve ser evitado.

Os AINEs não reduzem de modo significativo os sintomas ou duração das infecções respiratórias.


Os AINEs são amplamente utilizados por pacientes com IRA ou resfriado comum para alívio de dor e febre. Os benefícios e riscos de seu uso devem ser considerados. As evidências atuais sobre o coronavírus ainda são escassas, e por isso, as evidências sobre IRAs têm sido utilizadas como base para esta revisão.

Os AINEs aumentam as taxas de infarto do miocárdio em pacientes com IRAs?

(Data de atualização: 17/03/2020 e Data da tradução: 19/03/2020)

Doenças semelhantes à gripe e às IRAs estão associadas a aumento do risco de infarto agudo do miocárdio (IAM). Uma metanálise de 16 estudos caso-controle identificou que as doenças semelhantes à influenza eram duas vezes mais prováveis de ocorrer entre pessoas com IAM (Odds Ratio [OR]: 2,01; IC 95%: 1,47-2,76) (1).

O uso prolongado de AINEs tem sido associado ao aumento do risco de parada cardíaca. Dados individuais de quatro estudos com 446.763 indivíduos incluindo 61.460 pessoas com IAM, mostraram o uso de AINE em qualquer dose por uma semana ou mais estava associado ao aumento de 50% do risco de IAM (OR [Ibuprofeno]: 1,48; IC 95%: 1,00 – 2,26; OR [diclofenaco: 1,50; IC 95%:1,06 – 2,04; OR [naproxeno]: 1,53; IC 95%: 1,07 – 2,33) (2).

O uso de AINEs durante IRAs têm sido associado a aumento do risco de infarto do miocárdio.

(Data de atualização: 17/03/2020 e Data da tradução: 19/03/2020)

Uma análise retrospectiva de 9.793 casos incidentes de IAM em Taiwan, entre 2007 e 2011, constatou que:

  • Em pessoas que usaram AINEs durante IRAs, o risco de IAM aumentou 3,4 vezes (odds ratio ajustado [ORajustado]*: 3,41; IC 95%: 2,80 – 4,16);
  • Em pessoas que NÃO usaram AINEs durante IRAs, o risco de IAM aumentou 2,7 vezes (ORajustado: 2,65; IC 95% 2,29 – 3,06);
  • Em pessoas que usaram AINEs por via parenteral (qualquer via de administração não oral), o risco de IAM auemtou 7 vezes (ORajustado: 7,22; IC95%: 4,07 – 12,81) (3).

O uso de AINEs durante IRAs tem sido associado a um aumento do risco de acidente vascular encefálico (AVE)

(Data de atualização: 17/03/2020 e Data da tradução: 19/03/2020)

Uma análise de 29.518 caso incidentes de AVE sugeriu que o uso de AINEs estava associado a mais do que o dobro de risco de AVE (ORajustado: 2,27; IC95% 2,00 – 2,58). O uso de AINEs parenterais foi associado a um risco 4 vezes maior de AVE isquêmico (ORajustado: 4,24; IC 95%: 2,92 ‐ 6,15) e risco 9 vezes maior de AVE hemorrágico (ORajustado: 9,71; IC 95%: 3,79 ‐ 24,92) (4).

* Ajustado para uso discordante de medicamentos concomitantes antes da data índice.

  • Recomendação do British National Formulary / National Institute for Health and Care Excellence (BNF/ NICE, UK)

O uso de todos os AINEs (incluindo inibidores seletivos da ciclooxigenase-2) pode, em níveis variados, estar associado a um pequeno aumento do risco de eventos trombóticos (por exemplo, IAM e AVE), independentemente dos fatores de risco cardiovasculares iniciais ou da duração do uso. No entanto, o maior risco pode estar presente entre pacientes que recebem altas doses por um longo prazo.

A menor dose eficaz de AINE deve ser prescrita pelo menor período possível para controle dos sintomas; a necessidade de tratamento por longo prazo deve ser revista periodicamente.’(5)

Os AINEs afetam a duração da infecção?

Uma revisão sistemática Cochrane  que incluiu 9 ensaios clínicos randomizados (1.069 participantes) sobre os efeitos dos AINEs no tratamento do resfriado comum mostrou o uso de AINEs não houve reduziu significativamente o escore total de sintomas (DMP [diferença de média padronizada]: ‐0,40; IC95%: -1,03 a 0,24) ou a duração do resfriado comparado ao placebo. O efeito no alívio da dor (dor de cabeça, dor de ouvido e dores musculares e articulares) foi significativo (6).

Cinco estudos avaliaram eventos adversos. Uma metanálise sugeriu que o risco de eventos adversos gerais com o uso AINEs parece ser 3 vezes maior ​​(razão de risco [RR]: 2,94; IC 95%: 0,51 a 17,03), mas esta diferença não foi significativa. Os eventos adversos observados incluíram eventos gastrointestinais, letargia / sonolência, sensação de hiperatividade, sensação de estar mais acordado, rosto corado, dificuldade para dormir, tontura e boca seca (6).

O uso de AINEs piora os desfechos em infecções respiratórias?

Nós encontramos cinco estudos que relacionaram o uso de AINEs à piora dos desfechos, todos são estudos observacionais e são difíceis de interpretar, pois estão sujeitos a viés de  confusão relacionado à indicação: pacientes com sintomas mais graves podem utilizar mais AINEs, o que não necessariamente causa a doença. Todos os cinco estudos sugerem que os AINEs pioram os desfechos, o que reforça a recomendação de se usar a menor dose efetiva pelo menor período de tempo possível.

  1. Um pequeno estudo observacional prospectivo (com 57 participantes) mostrou que o uso de AINEs por mais de 6 dias e a presença de imunossupressão antes da admissão estavam associados à hospitalização prolongada. Os pacientes que usaram AINEs antes da hospitalização, o fizeram por um período médio de 4,4 dias (8).
  2. Em uma coorte de 90 pacientes consecutivos com pneumonia adquirida na comunidade (PAC) admitidos em uma UTI por um período de quatro anos, 32 (36%) haviam recebido AINEs antes de serem encaminhados ao hospitalar. Os pacientes em uso de AINEs eram mais jovens, tinham menos comorbidades e maior tempo de duração dos sintomas antes de serem encaminhados. Eles apresentavam mais empiema pleural e complicações de cavitação pulmonar (37,5% versus 7%; p = 0,0009) e apresentaram taxas mais altas de bacteremia (69% versus 27%, p = 0,009) quando comparados com os pacientes que não usavam AINEs. (9).
  3. Em um estudo que avaliou 221 pacientes com PAC, 40 (18%) desenvolveram uma complicação pleuropulmonar. O uso de AINEs antes da admissão foi relatada em 24 pacientes (11%), os quais eram mais jovens (51 versus 67 anos), apresentavam menos comorbidades (60 versus 25%) e maior tempo entre os primeiros sintomas da PAC e o início da antibioticoterapia (6,1 versus 2,8 dias; p = 0,001). Eles também apresentaram taxas mais altas de complicações pleuropulmonares (33 versus 16%; p = 0,048)  do que os pacientes que não usavam AINEs (10).
  4. Os AINEs também podem mascarar os sintomas iniciais e retardar a terapia antimicrobiana. Uma revisão de prontuários médicos de 106 pacientes com PAC pneumocócica confirmada mostrou que 20 receberam AINEs de 2 a 6 dias antes da admissão. Os pacientes expostos aos AINEs eram mais jovens (43 versus 62 anos), tiveram mais derrames pleurais complicados (20% versus 2,3%; p = 0,01) e exigiram mais suporte ventilatório não invasivo (25% versus 4,6%; p = 0,003) (11).
  5. Um estudo caso-controle multicêntrico realizado em 8 UTIs incluiu 152 pacientes adultos internados por sepse grave ou choque séptico devido à infecção bacteriana adquirida na comunidade. Este estudo mostrou que em pacientes em uso de AINEs (27%) o tempo médio para a prescrição de antibioticoterapia efetiva foi mais longo (média: 6 dias, IC 95%: 3 a 7 dias), do que para os pacientes que não estavam em uso (média: 3 dias; IC 95% = 2 a 3 dias; p = 0,02) (12).

Os AINEs têm impacto na mortalidade geral de pessoas com IRAs? 

Resposta disponível em breve.

Os AINEs aumentam os problemas renais e / ou hipertensão arterial em pessoas com  IRAs? 

Resposta disponível em breve.


Declaração: este artigo não foi revisado por pares; não deve substituir o julgamento clínico individual e as fontes citadas devem ser verificadas. As opiniões expressas nesse comentário representam as opiniões dos autores e não necessariamente as da instituição anfitriã, do National Health Service (HHS), do National Institute for Health Research (NIHR) ou do Departamento de Saúde do Reino Unido. As opiniões não substituem a consulta médica.

Link para o original: https://www.cebm.net/oxford-covid-19/nsaids-in-acute-respiratory-infection/

Deve ser citado como: Oxford COVID-19 Evidence Service. Carl Heneghan and Jon Brassey. https://www.cebm.net/oxford-covid-19/nsaids-in-acute-respiratory-infection/.