Nome original do viés: Mimicry bias
Tradução: Carolina OC Latorraca, Rafael Leite Pacheco, Enderson Miranda, Rachel Riera
Uma exposição inocente pode se tornar suspeita se, em vez de causar a doença, causa uma condição benigna que se assemelha à doença.
Introdução
Quando se avalia o quanto uma exposição se relaciona a uma doença, é importante ter certeza que o desfecho investigado é realmente a doença, e não uma condição que se assemelha à doença, o que poderia levar a conclusões falsas sobre as causas da doença de interesse.
Exemplo
O exemplo referenciado por David Sackett em sua publicação de 1979 é a de um estudo que investiga a relação entre o uso de contraceptivos orais e hepatite, publicado por Morrison e colegas em 1977. Entre um grupo de mulheres atendidas em um hospital, aquelas com hepatite eram mais suscetíveis ao uso de contraceptivos orais do que as mulheres que não tinham hepatite. Porém, os autores sugerem cuidado ao interpretar essa associação e sugerem que:
“Alguns dos diagnósticos de ‘hepatite’ entre usuárias de contraceptivos orais podem ter sido incorretos, e na verdade serem casos de icterícia induzida por essas drogas. A ‘icterícia da pílula’ parece surgir logo após o início do uso dos contraceptivos orais. No presente estudo, 55% dos casos que utilizaram…”
O viés de relato também pode impactar o nosso entendimento da doença e pode introduzir viés de semelhança. Para descrever os potenciais benefícios e riscos do oseltamivir, os investigadores pontuaram que um dos desfechos de interesse era pneumonia. Porém, análises detalhadas dos relatos do estudo revelaram que o desfecho verdadeiro era auto-relatado e não diagnosticado por investigação clínica. Os participantes podem ter achado que tinham pneumonia, mas não houve uma forma de realmente confirmar a doença já que os sintomas podem se assemelhar a doenças virais.
Impacto
A semelhança pode ter impacto no diagnóstico. A sífilis, por exemplo, pode ser similar a uma grande variedade de doenças, em cada uma de suas fases. A sífilis primária tem uma apresentação atípica, ou seja, apenas 30 a 40% dos pacientes são diagnosticados nesta fase inicial. Outro exemplo é a intussuscepção intestinal, que é uma doença abdominal emergencial comum na infância, mas que possui apresentação semelhante à outras doenças que devem ser levadas em consideração como diagnóstico diferencial. O BMJ tem uma série chamada “Easily Missed” dedicada a aumentar o conhecimento de condições com sinais e sintomas inespecíficos que passam facilmente despercebidas no primeiro atendimento e cujo diagnóstico imediato normalmente é difícil de ser realizado.
Passos para prevenção
Garantir o diagnóstico correto da condição é o desfecho utilizado por estudos investigando fatores causais. Normalmente isso significa utilizar um teste referência “padrão ouro” para confirmar o diagnóstico. Os leitores devem tomar cuidado com estudos que se baseiam apenas nos sintomas e em medidas auto-relatadas pelos pacientes para inferir desfechos críticos.
Link para o original: https://catalogofbias.org/biases/mimicry-bias/
Deve ser citado como: Catalogue of Bias Collaboration, Spencer EA, Heneghan C. Mimicry bias. In: Catalogue Of Bias 2017. https://catalogofbias.org/biases/mimicry-bias/
Fontes
Jefferson T et al. Oseltamivir for influenza in adults and children: systematic review of clinical study reports and summary of regulatory comments BMJ 2014; 348 :g2545
Lautenschlager S Diagnosis of syphilis: clinical and laboratory problems.J Dtsch Dermatol Ges. 2006 Dec; 4(12):1058-75.
Morrison AS et al. Oral contraceptives and hepatitis. A report from the Boston Collaborative Drug Surveillance Program, Boston University Medical Center. Lancet. 1977 May 28;1(8022):1142-3.
Sackett DL. Bias in analytic research. J Chron Dis 1979; 32: 51-63.